Gestão Das Águas É Essencial

Falta de chuvas não é o único problema que causa os baixos níveis de água dos reservatórios, existem outros


Gestão Das Águas É Essencial

 

Com a falta de chuvas ocorrida nos últimos tempos, as soluções para resolver os níveis baixos do complexo Cantareira e demais sistemas na Região Metropolitana de São Paulo e complexos de outros Estados passam por diversas questões que não somente agora que estão ocorrendo problemas com o abastecimento e nos obrigando a achar uma solução devemos nos preocupar mais. Na verdade, devemos olhar para todo o contexto destas questões, que é ainda maior porque envolve como tratar o meio ambiente para que a água possa nascer e fluir no seu leito e possamos usufruí-la de acordo com nossas demandas. Tudo isso sem castigá-lo ou puni-lo (o meio ambiente) por nossa falta de consciência e deficiências de como saber lidar com todos os recursos que a água nos proporciona.

Soluções
Os reservatórios que abastecem a Região Metropolitana de São Paulo são formados por mananciais de água doce, superficiais ou subterrâneos, que incluem, segundo o site da Sabesp, os seguintes sistemas de cursos d’água e represas: Cantareira, Guarapiranga, Rio Claro, Rio Grande, Alto Tietê, Ribeirão da Estiva e Alto Cotia e Baixo Cotia. Estes oito complexos integrados produzem juntos 67 mil litros de água por segundo, atendendo 33 municípios e mais seis que compram por atacado, Santo André, São Caetano do Sul, Guarulhos, Mogi das Cruzes, Diadema e Mauá.
Janeiro de 2014 foi o mês que houve recorde de calor na capital e também amargou o pior índice de chuvas, 87,8 milímetros, em 84 anos de medição, iniciada em 1930. Dezembro de 2013 atingiu 62 milímetros. A média para os meses de dezembro é de 226 milímetros e de janeiro, 260 milímetros. Toda essa falta de chuvas deixou os reservatórios do sistema Cantareira e demais com baixos níveis de água para abastecimento.
"A falta de chuva é o de menos. Afinal, quando chove muito alaga e quando chove pouco a água acaba. O que falta é a gestão de nossas águas e o fortalecimento dos Comitês de Bacias Hidrográficas para que sejam de fato soberanos na gestão hídrica", alerta Gustavo Veronesi, coordenador do Observando o Tietê, da Fundação SOS Mata Atlântica. Para ele, também é preciso o planejamento e a aplicação do Estatuto da Cidade, já que mais de 80% da população brasileira vive em meio urbano, execução de planos diretores, planos de saneamento, planos de resíduos sólidos, planos municipais de Mata Atlântica nos locais em que estão nesse Bioma. "Participação social é outra questão muito importante porque precisamos ir além da democracia representativa e mergulharmos numa democracia participativa", diz.
Na opinião de Frederico de Almeida Lage Filho, professor doutor de Pós-Graduação em Gestão, Perícia e Auditoria Ambiental das Faculdades Oswaldo Cruz e consultor da Brasil Ozônio (Cietec/Ipen-USP), a má distribuição espacial e a baixa quantidade das chuvas este ano na Região Metropolitana de São Paulo deverão obrigar a tomada de medidas emergenciais para a população abastecida pelo Sistema Cantareira, como racionamento, rodízio de abastecimento e outras.
Têm impacto direto sobre os baixos níveis de água nos sistemas, segundo Ana Elizabeth Juliato, especialista em Recursos Hídricos da Agência Nacional de Águas (ANA), os fatores relativos ao uso e ocupação do solo e aqueles relacionados à utilização inadequada dos recursos hídricos. "As soluções vão desde a conscientização da população até obras de infraestrutura hídrica e ações de regulamentação e fiscalização para uso mais sustentável", aponta.
"Estaremos vulneráveis à situações de escassez e conflito se não houver a conscientização de todos de que a água é um recurso finito e que dela depende não somente a sobrevivência dos seres vivos, mas que também sua existência em quantidade e qualidade é determinante no desenvolvimento das atividades humanas, sociais e econômicas", ressalta a especialista da ANA.

 

Qualidade da água
A Fundação SOS Mata Atlântica fez recentemente uma pesquisa com 177 amostras analisando a qualidade da água de rios, córregos e represas em sete Estados do Sul e Sudeste brasileiros. Em 40% das amostras, a situação é ruim ou péssima, em quase metade delas, está regular e somente 11% têm boa qualidade – áreas protegidas com matas ciliares preservadas. De acordo com a ONG, os principais motivos advêm da falta de tratamento de esgoto doméstico, dos produtos químicos jogados em redes públicas e da poluição do lixo.
Segundo Gustavo Veronesi, coordenador do Observando o Tietê, da Fundação SOS Mata Atlântica, a situação da qualidade das águas no Brasil ainda é muito crítica, principalmente pelo baixo nível de tratamento de esgoto doméstico e industrial. "Os quatro pilares do Saneamento Básico – abastecimento público, tratamento de esgoto, gestão de resíduos sólidos e escoamento de água fluvial – são extremamente deficientes no País. Há uma relação importante entre floresta preservada e água em quantidade e qualidade." De acordo com Veronesi, para a preservação dos nossos mananciais "é preciso cumprir as leis ambientais, cuidar das nascentes e das Áreas de Preservação Permanente (APPs), tratar o esgoto, destinar o lixo de forma adequada e, principalmente, investir sempre em processos educativos formais, informais e não formais", afirma.


 

Outros motivos
Além da falta de chuvas, a ocupação desordenada, desmatamento, uso inadequado do solo e da água, falta de infraestrutura de saneamento, superexploração dos recursos hídricos, remoção de cobertura vegetal, erosão e assoreamento de rios e córregos e atividades industriais que descumprem a legislação ambiental, algumas já citadas acima, também causam degradação das áreas de mananciais e afetam os níveis baixos dos sistemas.
De acordo com Lage Filho, outro fator essencial não citado são as perdas por vazamentos ou ligações clandestinas nas redes de abastecimento, que podem chegar a quase 1/3 de toda a água potabilizada distribuída aos consumidores. Segundo ele, as soluções para os problemas citados seriam a agilização das legislações federais, estaduais e municipais e a integração de órgãos envolvidos na Gestão de Recursos Hídricos. Além disso, a destinação de mais recursos financeiros que os atuais, aliados a um corpo técnico capacitado, o que já existe, para cuidar dos múltiplos problemas. Outra solução seriam mais e melhores práticas de manejo das bacias hidrográficas.
O crescimento populacional e a expansão do consumo per capita também atingem os níveis dos complexos de água. Uma solução apontada por Veronesi, do SOS Mata Atlântica, está na descentralização das atividades econômicas no País. "Isso seria algo bem interessante para desinchar nossas cidades. Nos meios urbanos consolidados, poderia haver a criação de parques lineares que ajudariam na despoluição do rio, a evitar enchentes e a recarregar o lençol freático", indica. O tratamento de esgoto é outra solução citada pelo coordenador. "Afinal, água poluída é desperdício também."
Para o professor doutor Lage Filho, o aumento do consumo e a perda progressiva da qualidade de águas superficiais e subterrâneas exercem enorme pressão sobre os sistemas abastecedores. A solução passa por aplicar mais e melhores medidas de:
• Ensino com o objetivo de conscientizar todos os consumidores para evitar mau uso e desperdícios.
• Implementação de sistemas de tratamento e abastecimento descentralizados.
• Uso mais racional da água.
• Implementação, ao máximo, de águas de reúso (municipais e industriais) em usos menos nobres que os de abastecimento e de produção de alimentos.
• Maior e melhor controle de perdas de água nas redes.

 

 

Bônus ampliado e estudo de ônus
O secretário estadual de Recursos Hídricos do Estado de São Paulo, Mauro Arce, anunciou que estuda a adoção de ônus aos consumidores da Grande São Paulo que não economizarem água. Essa ação, segundo ele, seria uma medida de justiça aos que aderiram à economia. De acordo com a Sabesp, no geral, a utilização do bônus foi bem aceita pela população. Um mês após a criação do bônus aplicado aos consumidores do Cantareira, 76% aderiram ao programa. Desses, 37% ganharam bônus; 39% economizaram, mas não dentro da meta do desconto; e 24% não fizeram economia de água. Agora, o bônus foi ampliado para toda a Região Metropolitana.
Para atingir a meta de 20% de redução no consumo e ganhar 30% de desconto na sua conta, veja as dicas da Sabesp aos consumidores:
• Tome banhos curtos e feche o registro ao passar sabonete e xampu. Banho com aquecedor por 15 minutos gasta 135 litros de água. Com registro fechado ao ensaboar e duração de 5 minutos, cai para 45 litros;
• Não lave a calçada com mangueira. Use a vassoura para limpar o local;
• Não lave o carro com mangueira. Em vez de utilizá-la, use um balde e um pano. Uma lavagem de 30 minutos com a mangueira aberta gasta até 560 litros. Com o balde, cai para 40 litros;
• Antes de lavar a louça, limpe os restos de comida e feche a torneira. Ao ensaboar, também deixe a torneira fechada. O consumo pode cair de 240 litros para 20 litros;
• Acumule as roupas para utilizar a máquina de lavar na capacidade máxima. Faça o mesmo com as louças;
• Deixe a torneira fechada enquanto escova os dentes ou faz a barba;
• Corrija o mais rápido possível os vazamentos dentro do imóvel;
• Molhe as plantas à noite e utilize um regador em vez da mangueira, que pode gastar até 190 litros em 10 minutos;
• Depois do mergulho, a água das piscinas das crianças também pode ser mais bem aproveitada: use-a para lavar o quintal, por exemplo.


 

Investimentos
A destruição dos mananciais causa sérios problemas no abastecimento das cidades. De acordo com Veronesi, os Estados estão buscando água cada vez mais distante das Regiões Metropolitanas para suprir sua demanda hídrica. "Todo o processo de planejamento urbano focou nas cidades grandes sem se preocupar com a estruturação adequada para a demanda, o que causou o aumento de obras emergenciais, nunca favoráveis ao erário público. É preciso um planejamento eficiente e sustentável e fiscalização, execução e cumprimento da legislação vigente", adverte.
Para Ana Elizabeth, da ANA, quase todos os principais aglomerados urbanos do País (capitais estaduais e regiões metropolitanas com mais de 1 milhão de habitantes) necessitam de investimentos para a ampliação da oferta de água, incluindo aproveitamento de novos mananciais ou adequação dos sistemas produtores. "Os R$ 9,6 bilhões previstos para essas regiões beneficiarão 256 sedes municipais, onde se concentra quase metade da população urbana brasileira", informa. Esses valores, segundo ela, chamam a atenção pelo volume, mas são resultantes, conforme foi citado acima, da busca de mananciais cada vez mais distantes e da crescente complexidade da infraestrutura hídrica para o atendimento das demandas.
São R$ 5,3 bilhões em investimentos, segundo Ana Elizabeth, para as ampliações dos sistemas produtores em Regiões Metropolitanas, como Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Vitória, Porto Alegre, Florianópolis, São Luís, Salvador, Aracaju, Goiânia, Belém, Macapá e Manaus, além da Região Integrada de Desenvolvimento (Ride) Teresina e das capitais: Rio Branco, Porto Velho, Boa Vista e Cuiabá. "Apesar de seus mananciais serem considerados como suficientes para as demandas futuras, as ampliações visam à melhoria da capacidade operacional dos sistemas de abastecimento de água", destaca a especialista em Recursos Hídricos da ANA.
Segundo ela, predominam os investimentos em novos mananciais no valor total de R$ 4,3 bilhões para as Regiões Metropolitanas de São Paulo, Campinas e Baixada Paulista, Curitiba, Fortaleza, Recife, Natal, João Pessoa e Maceió e na Região Integrada de Desenvolvimento (Ride) do Distrito Federal e de Palmas (TO).

 

Contatos:
SOS Mata Atlântica:
www.sosma.org.br
Frederico de Almeida Lage Filho: Faculdade Oswaldo Cruz e Brasil Ozônio (Cietec/Ipen-USP)
Agência Nacional de Águas (ANA): www.ana.gov.br

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