Os Resíduos Sólidos Como Geração De Energia

O tratamento de água e de efluente (ETA e ETE), por meio de processos e operações com introdução de produtos químicos, geram resíduos


Os Resíduos Sólidos Como Geração De Energia

 

O tratamento de água e de efluente (ETA e ETE), por meio de processos e operações com introdução de produtos químicos, geram resíduos. Os mesmos devem ser tratados e dispostos de maneira correta para evitar danos ao meio ambiente. Se despejados diretamente nos cursos d’água sem qualquer tipo de tratamento, por causa da presença de agentes patogênicos e metais pesados, podem gerar riscos à saúde humana.
Segundo a Lei nº 12.305/10, que institui a política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), resíduos sólidos são: "materiais, substâncias, objeto ou bem descartado resultante de atividades humanas em sociedade, a cuja destinação final se procede, se propõe proceder ou se está obrigado a proceder, nos estados sólido ou semissólido, bem como gases contidos em recipientes e líquidos cujas particularidades tornem inviável o seu lançamento na rede pública de esgotos ou em corpos d’água, ou exijam para isso soluções técnicas ou economicamente em fase da melhor tecnologia disponível".
De acordo com Marcus Vallero, gerente de vendas da divisão de Water & Process Technologies da GE, os resíduos sólidos gerados em um processo biológico basicamente são oriundos do próprio efluente a ser tratado e também devido ao crescimento dos microrganismos responsáveis pela oxidação da matéria orgânica e nitrogenada no efluente.
"Estes microrganismos formam flocos biológicos que permanecem em suspensão no reator biológico e devem ser criteriosamente retirados para manter o correto funcionamento do sistema. A rigor, pode-se dizer que a carga de poluentes é, em boa medida, transferida da fase líquida para a fase sólida, de modo que este lodo gerado necessita de tratamento adequado antes do seu descarte ao ambiente", completa Marcus.
Neste contexto, a problemática dos resíduos de ETA e ETE é considerada uma questão séria para as instituições que gerenciam os sistemas de abastecimento de água, na procura de disposição adequada para atender à legislação vigente. O lodo sanitário é um dos principais produtos resultantes de soluções utilizadas para tratamento de esgotos. Estações de tratamento de esgotos produzem grande quantidade de lodo e o planejamento para sua destinação final pode ser otimizado e sinergizado quando se propõem soluções integradas com os resíduos sólidos urbanos.
Marcus explica que estes resíduos sólidos são muito ricos em matéria orgânica e nutrientes, tanto que em países onde são devidamente tratados, o lodo ganha o nome de biosólidos. A EPA (Environmental Protection Agency) americana, por exemplo, determina que biosólidos são um material orgânico rico em nutrientes que, quando tratados e processados, podem ser reciclados e aplicados como fertilizantes para aumentar a produtividade dos solos e estimular o crescimento de plantas. "Dependendo do nível de tratamento, os sólidos podem ser de Classe A (com níveis não detectáveis de patógenos), sendo permitida a sua aplicação em solos, ou de Classe B (quando há a medição de concentrações baixas de patógenos) que tem mais restrições para sua aplicação", ressalta o gerente.

Processo de aproveitamento
Ainda de acordo com a Lei 12.305/2010, a Política Nacional de Resíduos Sólidos define a Reutilização de resíduos: "Processo de aproveitamento dos resíduos sólidos sem sua transformação biológica, física ou físico-química, observadas as condições e os padrões estabelecidos pelos órgãos competentes do Sisnama e, se couber, do SNVS e do Suasa".
O engenheiro Matheus Magalhães de Almeida Ganem, coordenador do mercado ambiental e mineração da Maccaferri, explica que a reutilização de resíduos sólidos pode se caracterizar pela fabricação de um produto onde é possível sua reutilização sem perda significativa de sua qualidade inicial. A reutilização pode ter a finalidade de prolongar a vida útil de um produto no mercado ou encontrar novas finalidades para o seu uso. Produtos reutilizáveis podem ter indicação de ciclos de produção até chegar a sua vida útil.
"Exemplos como garrafas plásticas, ou de vidro podem ser reutilizadas várias vezes antes de serem de fato recicladas. Outro resíduo reutilizável é o da construção civil, onde pode ser vendida para aplicações em obras, utilização em soluções de contenções, entre outras aplicações. Para que estes produtos possam ser reutilizados se faz necessário um tratamento antes de sua reintegração no setor de produção", completa Matheus.
As aplicações para o lodo bruto (sem processamento - i.e. adensamento, desaguamento e secagem) são inexistentes. O mesmo somente passa a, efetivamente, ter algum potencial de reutilização a partir do momento em que é seco. As aplicações podem variar de acordo com as regulamentações locais em vigor, bem como as características do lodo produzido. Agricultura (biofertilizante), landscaping (composição, humificação) e tratamento térmico (mono-incineração, co-incineração, gaseificação, pirólise) são alguns exemplos de aplicação de lodo. Os processos de adensamento e desaguamento são bem conhecidos.
Os princípios de operação podem variar (e.g. por gravidade, força centrífuga e mecânica), mas o objetivo final é sempre o mesmo: reduzir ao máximo o teor de água. Isto gera diversos benefícios operacionais e financeiros, tal como: facilitação do manuseio do produto, redução do custo de transporte para aterros, otimização de processos de digestão posteriores, entre outros.
"Alguns aspectos inerentes ao princípio de operação adotado nas etapas de adensamento e desaguamento podem, ou não contribuir, para a obtenção de resultados melhores. A Huber, por exemplo, trabalha com sistemas de adensamento e desaguamento mecânicos. Estes trabalham em baixa rotação e por prensagem do lodo contra cesto de tela em aço inoxidável inclinado. Nestas condições, diversos são os benefícios operacionais e financeiros: baixos consumo de energia elétrica, desgaste de peças, custo de manutenção, nível de ruído (70 dB(A)), etc", explica Willian Okada, representante da Huber.
Wilian Okada explica ainda que o processo de secagem, comparativamente, mais recente do que os processos de adensamento e desaguamento consiste na redução de água para teores entre 30 a 1%. O lodo, quando em umidade baixa, tal como ocorre após o processo de secagem, torna-se apto para ser aproveitado nas áreas previamente descritas. As características inerentes ao lodo (e.g. presença de metal pesado, contaminantes, matéria orgânica, entre outros), somadas ao teor de água, determinam quais as possibilidades de aproveitamento deste produto. "Quando o teor de matéria orgânica é elevado, por exemplo, o lodo tem seu poder calorífico inferior (PCI) drasticamente elevado, comparável a carvão mineral, podendo ser utilizado como fonte de energia térmica", completa.

Onde e como podemos reaproveitar os resíduos?
Algumas pesquisas foram realizadas nos últimos tempos com objetivo de encontrar meios de reaproveitar ou dar uma destinação ecologicamente correta ao lodo. Comprovou-se que o lodo é um combustível com elevado poder calorífico, com grande potencial para uso na agricultura e ainda avalia-se a possibilidade de se utilizar como incremento de cimenteira e ou fábrica de tijolos.
Felipe Igor da Silva, engenheiro mecânico da Haarslev, explica que os principais elementos químicos encontrados na maioria dos combustíveis são: carbono, hidrogênio, oxigênio, nitrogênio e o enxofre. Para que um material possa ser considerado industrialmente combustível é necessário ter facilidade no uso, não formação durante a combustão de substâncias tóxicas ou corrosivas, segurança no armazenamento e no transporte.
Os poluentes possíveis de serem formados durante a queima de um combustível orgânico são monóxido de carbono (CO) e dióxido de carbono (CO2), óxidos de enxofre (SO2 e SO3), materiais particulados e óxidos de nitrogênio (NO, NO2 e NO3), as quantidades de poluentes depende do tipo de combustível utilizado, tipo do equipamento de queima e das condições de operação do sistema.
"Deve-se fazer um controle das emissões de gases que varia de acordo com a composição química do lodo. É possível fazer a queima desde que se tomem as devidas precauções, geralmente é necessário colocar filtros manga, eletrostático e carvão ativado que no Brasil atualmente se tornam extremamente caros, também não existe uma legislação específica para queima do lodo, o que existe é resolução 316 do CONAMA que dispõe sobre procedimentos e critérios para funcionamento de sistemas térmicos de resíduos que seja realizado a uma temperatura mínima de 800°C. Em função do poder calorífico do lodo após a secagem, poderia facilmente substituir uma demanda significativa de combustíveis fósseis, diminuindo gastos para indústria e destinando o lodo" explica Felipe.
Ele também pode ser utilizado como condicionador das propriedades do solo ou como fertilizante, em função do seu conteúdo em matéria orgânica, nitrogênio, fósforo e micronutrientes. Apesar de uma composição favorável a agricultura, o lodo de esgoto também apresenta quantidades variáveis de metais pesados, que podem ser tóxicos para plantas, microrganismos, animais e o homem, se as quantidades absorvidas ou ingeridas estiverem acima de certos limites. Para o uso correto do lodo é preciso seguir uma legislação específica que estabeleça limites e permita uma aplicação adequada.
"A composição do tijolo é formado por água, terra e cimento e existem pesquisas que tiveram sucesso na utilização de lodo em proporções adequadas na produção de tijolos. Existem também aplicações para cimenteiras que recebem o lodo como matéria prima, no entanto, eles cobram para receber o lodo", explica Felipe. O engenheiro ressalta ainda que existem inúmeras possibilidades de se fazer tijolos que sejam sustentáveis, o tijolo é matéria-prima básica da construção civil. Para fabricação do tijolo convencional (alvenaria), ele precisa ser cozido em fornos nas olarias, para esse processo é necessário queimar uma grande quantidade de lenha. Para o tijolo ecológico não é necessário fazer o cozimento em fornos, o que elimina a utilização de lenha e traz economia considerável na obra.

Geração de energia
Takeo Tomita da RGT International comenta que o lodo proveniente do sistema de tratamento de efluentes no Brasil não é utilizado para aproveitamento energético no Brasil, sendo depositados em aterros sanitários o que é um desperdício, pois, possui poder calorífico para geração de energia.
Segundo Matheus, na Europa, vários países utilizam lodos provenientes de processos de tratamento de efluentes para geração de energia, porém no Brasil ainda tem pouca iniciativa. A princípio a tecnologia se dá pela implementação de uma termoelétrica que ira realizar a cogeração de energia. Alguns especialistas explicam que durante o tratamento do esgoto, gera-se metano produzido por biodigestores (para onde são direcionados os lodos) onde este pode ser canalizado para a termelétrica gerando calor em suas turbinas, além disso, pode-se aquecer o lodo utilizado na reação anaeróbica dos processos de tratamento.
"Há dois claros benefícios da digestão anaeróbia dos biosólidos em uma planta de tratamento de efluentes: (i) geração de biogás contendo metano, (ii) redução da massa de sólidos a ser descartada/disposta após o tratamento. Portanto, a digestão apropriada do lodo traz enormes benefícios econômicos e ambientais para a operação da planta, pois um digestor de lodo convenientemente dimensionado e operado reduz dramaticamente os custos de disposição dos lodos e ainda pode gerar energia e calor para atender, ao menos parcialmente, a demanda de energia e calor na operação da planta de tratamento dos efluentes", acrescenta Marcus da GE. O representante explica ainda que normalmente, estes digestores anaeróbios são unidades muito grandes, pois a digestão apropriada depende de um tempo de residência muito grande (da ordem de 30 dias) para os processos de hidrólise e digestão do lodo.
Em adição, sabe-se que a mistura destes digestores é frequentemente ineficiente ou intensiva no uso de energia para a mistura, uma vez que os digestores podem receber lodos relativamente concentrados (adensados).
Por esta razão, o mercado de tratamento de efluentes tem buscado por soluções que permitam o upgrade dos digestores anaeróbios existentes em "supercentros" de digestão avançada, que permitam aumentar sua capacidade de processamento e, ao mesmo tempo, reduzir o tempo necessário para a digestão.
"A GE recentemente incorporou a companhia inglesa Monsal, que possui um vasto portfólio de equipamentos e soluções para otimizar a performance de digestores anaeróbios. Por exemplo, reconhece-se que a mistura dos sólidos dentro de um digestor é um elemento crítico na otimização da performance destas unidades. A GE Monsal tem o expertise no entendimento da reologia de lodos adensados em digestores com a tecnologia de mistura com gás (gas mixing)", explica Marcus.
Esta tecnologia de mistura é de baixíssima intensidade energética (ex. < 15 kW de potência instalada para misturar digestores anaeróbios acima de 5000 m³). Ela permite aumentar significativamente a carga admissível de lodos nos digestores, provendo uniformidade (evitando depósitos de lodo no digestor) e um ambiente satisfatório para os processos biológicos, com o aumento da produção de biogás e energia (caso seja instalado um motogerador a gás) e reduzindo ainda mais o volume de sólidos a ser disposto.
Além da mistura adequada, outro elemento de crucial importância para a digestão anaeróbia é a etapa de pré-tratamento do lodo. Esta etapa tem a função de facilitar a digestão no digestor anaeróbio. Há várias alternativas no mercado, com a pré-hidrólise termal, a ultrasonificação e processos hidrolíticos. A GE Monsal aplica o processo hidrolítico avançado no pré-tratamento de lodos por se tratar de um pré-tratamento de baixa intesidade energética. O pré-tratamento hidrolítico avançado baseia-se em um processo plug-flow com aproximadamente 3 dias de residência onde intensifica-se a acificação e hidrólise do lodo.
Com esta etapa de pré-tratamento hidrolítico, temos 2 benefícios: redução do tempo de residência necessário para a digestão do lodo pela metade do necessário se comparado a um digestor convencional e aumento da produção de biogás (com redução de aproximadamente 55% dos sólidos suspensos voláteis). Uma opção muito importante é a possibilidade de se incluir etapa no pré-tratamento a uma temperatura de 55°C (por 1 a 2 dias) o que permite a geração de biosólidos classe A ao final da digestão anaeróbia (redução de E Coli de 6log).
A Huber SE também apresenta soluções para geração de energia, em cooperação com a empresa alemã WTE (Grupo EVN), formou uma joint venture denominada Sludge2Energy, onde as tecnologias e know-how em secagem de lodo (Huber) e processamento de resíduos sólidos (WTE) foram combinadas para desenvolvimento de um sistema inovador de secagem de lodo com aproveitamento de energia térmica e geração de energia elétrica (quando excedente). O sistema integrado gera lodo seco, que é aproveitado na geração de energia térmica (incineração). A energia térmica é utilizada para alimentar o sistema de secagem e, quando excedente, aproveitada para geração de energia elétrica. Alguns casos da S2E na Europa geram energia térmica e elétrica suficientes para alimentar o sistema e a própria planta de tratamento de efluentes.

Waste to energy: renda e redução de custos
Sistemas de geração de energia a partir de queima de resíduos sólidos contribuem muito para a redução de custos e/ou geração de renda para indústrias e municípios. A queima do resíduo no processo de geração de energia térmica reduz o consumo de combustíveis, energia elétrica (caso ocorra à produção da mesma ocorra pelo excedente de energia térmica no processo) e de cinzas (resíduo que pode ser classificado com Classe II A) a ser descartado.
"Quando oferecido ao mercado como serviço de processamento de resíduos sólidos, pode gerar rendas atrativas. As crescentes restrições com a implantação do Plano Nacional de Resíduos Sólidos vêm contribuindo para o aumento das taxas cobradas para descarte final deste e outros tipos de resíduos, tornando o waste to energy uma alternativa financeira e operacionalmente interessante", enfatiza Willian da Huber.
Matheus ressalta que os municípios, assim como as indústrias podem aproveitar os resíduos para a geração de energia e consequente redução nos seus custos. Porém a implementação destas soluções deve sempre está associada a uma visão integrada da gestão de resíduos sólidos. Assim as usinas se tornam um sistema complementar na hierarquia de destinação dos resíduos. "Existem várias tecnologias, e cada indústria tem uma particularidade e deve estudar a alternativa que se encaixa nos resíduos sólidos por elas geradas. Alguns exemplos são (aplicáveis a resíduos sólidos urbanos): digestão anaeróbica, usina de recuperação energética (URE), gaseificação, pirólise e plasma", completa.
Para Felipe, a crescente demanda energética mundial associada a preocupações ambientais, abre caminho para investimentos na geração de energias renováveis. Com os investimentos realizados na área de saneamento urbano e o crescimento da população, a coleta e o tratamento de esgoto tem um crescimento expressivo anualmente, essa produção de lodo no Brasil tem se tornado um problema cada vez maior que cria a necessidade de implantações de soluções tecnológicas que possam auxiliar no reaproveitamento destes resíduos, para que eles deixem de ser um problema e se tornem uma solução.
"Acreditamos que com a lei de resíduos sólidos 12.305, de 2 de agosto de 2010 entrando em vigor e sendo realmente aplicada, será um passo para destinação ecologicamente correta do lodo, onde deverão ser realizados legislações específicas para a aplicação do lodo de forma segura, seja como combustível, agricultura ou incremento de cimenteira e tijolo. A tendência é agregar valor ao lodo, transformando-o em um subproduto que possa viabilizar o investimento para sua destinação", completa o engenheiro.
Takeo Tomita da RGT International frisa que de acordo com a Lei federal implantada foi introduzido o conceito de logística reversa, responsabilizando o gerador do resíduo quanto a sua gestão adequada do mesmo, tanto setor público quanto privado devem dar a destinação correta de seus resíduos. "Em grande parte das situações, o uso de uma tecnologia torna-se obrigatória para atendimento da legislação. A recuperação energética faz sentido quando o resíduo possui poder calorífico e a solução a ser implementada traz um retorno financeiro que justifique a geração energética que é uma forma de redução de custos industriais. Quando não se justifica, por razões econômicas, a redução de custos industriais pode ocorrer com a simples destruição do resíduo de forma adequada evitando a geração de um passivo ambiental e colocando em risco a imagem da empresa e a sua percepção de valor" finaliza.

 

Contato das empresas:
GE Water:
www.gewater.com
Haarslev: www.haarslev.com
Huber: www.huberdobrasil.com.br
Maccaferri: www.maccaferri.com.br
RGT International: www.westinghouse-plasma.com

 

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